Geral

A indispensável autonomia do Banco Central

Dirceu Cardoso Gonçalves*

O presidente Lula, o ministro Fernando Haddad e outros membros do governo fazem questão de bater de frente com o Banco Central, afirmando que os juros são inflacionários e, como a inflação está baixa, a instituição monetária deveria baixar os juros (hoje fixados em 13,75% ao ano). Mas o banco diz que a inflação está caindo por conta do juro elevado, que impede a especulação no mercado. São duas visões antagônicas para a mesma questão. O governo alega que o juro é indutor da inflação, enquanto para o BC, é exatamente o contrário; os preços deixam de se elevar porque o juro alto impede a saturação do mercado.

Independente da influência inflacionária dos juros, o que assistimos é o presidente e sua equipe questionando a autonomia do BC – conquistada em fevereiro de 2021 através da Lei Complementar 179 – que estabelece mandato fixo e não coincidente com os períodos do do Executivo para o presidente e diretores do banco. O motivo das críticas não parece estar nos juros mas no fato de Roberto Campos Neto, cujo mandato à frente do BC vai até o próximo ano, ter sido nomeado ao tempo de Bolsonaro, não ser subordinado ao governo e só poder ser exonerado a pedido, por doença incapacitante ou por condenação definitiva por improbidade, hipóteses hoje inexistentes.

A autonomia dos Bancos Centrais é uma tendência mundial. Vigora nos 19 países da União Europeia e em outros 20,onde se incluem Estados Unidos, Reino Unido, Japão e o Brasil. Foi a forma encontrada para separar política partidária e economia para que uma não atrapalhe a outra. Ao fazê-las funcionar sem promiscuidade nem confusão de interesses, as nações conseguem melhores resultados e seguem a tendência de estabilidade mundial.

Lula em seu terceiro mandato chegou amargo e agressivo, especialmente em relação a Jair Bolsonaro, seu principal adversário. Deveria conter-se para evitar divergências cada dia maiores e, principalmente, a instabilidade político-administrativa do País. Pelo bem do Brasil, ambos deveriam evitar a polarização, assim como outros setores do poder não deveriam contribuir para a potencialização do embate.

A autonomia do Banco Central – pelo que se vê internacionalmente, é a tendência do momento. Os governos não devem mexer diretamente na política monetária. Se puderem agir como no passado, correremos o risco de voltar ao tempo em que o governante em dificuldade determinava a impressão de mais dinheiro e a inflação se tornava incontrolável. O administrador público precisa ter claro qual o viés de sua política econômica, mas a atividade monetária deve ser de um órgão independente, como têm sido feitos os bancos centrais na última década. Segundo o BC brasileiro, em agosto poderemos começar a experimentar a queda gradativa dos juros. É importante esperar sem politizar o setor. No próximo ano, Lula nomeará o presidente de sua preferência para o Banco.

Será muito importante para o país que o nomeado encontre a instituição em equilíbrio e, a exemplo do que tem feito Campos Neto, a mantenha distante da política partidária. Não deve nutrir a esperança de ali colocar um pau-mandado a quem possa dar ordens, pois o escolhido terá de seguir as decisões da diretoria e de conselhos da instituição que, quase sempre, são diferentes do que pretende o governo. Recorde-se que Bolsonaro nomeou um almirante para presidir a Petrobras e, passado algum tempo, teve com ele divergências, pois sua tarefa era viabilizar as decisões da empresa, não as do presidente da República. Reservadas as proporções, no Banco Central também é assim. Para diminuir ou eliminar a autonomia, teria de revogar ou reformar a Lei Complementar 179, no Congresso Nacional.

O País vive um delicado momento econômico. A conjuntura mundial exige reformas que nos coloquem em condições de operar no mercado. Temos comodities – minerais e alimentícias – para vender e manufaturados e tecnologia para adquirir, além de uma série de negócios de interesse da Nação. Nas próximas semanas veremos o Senado Federal votando a reforma tributária, que já passou pela votação básica na Câmara dos Deputados.

Supermercados, produtores agrícolas e até o setor de combustíveis pedem a redução de impostos para seus produtos. No interesse nacional, os senadores devem analisar as propostas e cotejá-las com as necessidades do País e a possibilidade contributiva da população. É com a busca desse equilíbrio que se poderá construir a prosperidade nacional. E, para a estabilidade econômica, o Banco Central precisa continuar à salvo das injunções políticas. Deve ser um lastro garantidor do nosso crédito perante o mundo…

*Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
aspomilpm@terra.com.br

Botão Voltar ao topo

Adblock detectado

Uia!!!