Geral

É vedado pagar aposentados
com recursos do Fundeb

Imprensa TCE-PR

O ordenamento jurídico brasileiro não autoriza, em regra, o emprego dos recursos previstos nos artigos 212 e 212-A da Constituição Federal para o custeio de despesas com servidores inativos. Portanto, os recursos vinculados ao custeio da Educação e aqueles do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) não podem ser utilizados para o pagamento de benefícios a aposentados.

Essa é a orientação do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo Município de Bela Vista do Paraíso (Norte do Estado), por meio da qual questionou sobre a possibilidade de se utilizar recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento do ensino para o pagamento de indenização a título de licenças-prêmio não usufruídas oportunamente por professores inativos da educação básica.

Instrução do processo
A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR afirmou que não é possível o uso de recursos previstos nos artigos 212 e 212-A do texto constitucional para o pagamento de despesas de caráter indenizatório a servidores inativos.
A unidade técnica acrescentou que esses recursos devem ser destinados especificamente para o pagamento da remuneração de servidores ativos, o que não inclui o pagamento de verbas de natureza indenizatória a inativos.

O Ministério Público de Contas (MPC-PR) concordou integralmente com o posicionamento da CGM.

Legislação e jurisprudência
O Fundeb é um fundo especial de natureza contábil dos estados, composto por recursos provenientes de impostos e das transferências dos estados, Distrito Federal e municípios vinculados à educação, conforme disposto nos artigos 212 e 212-A da Constituição Federal.

O Fundeb foi instituído como instrumento permanente de financiamento da educação pública por meio da Emenda Constitucional n° 108/20 e é regulamentado pela Lei nº 14.113/20.
O artigo 212 da Constituição Federal (CF/88) dispõe que a União aplicará, anualmente, nunca menos de 18%, e os estados, o Distrito Federal e os municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.

O parágrafo 7º desse artigo fixa que é vedado o uso dos recursos vinculados à educação para pagamento de aposentadorias e de pensões.

O artigo 212-A da CF/88 estabelece que os estados, o Distrito Federal e os municípios destinarão parte dos recursos da educação à manutenção e ao desenvolvimento do ensino na educação básica e à remuneração condigna de seus profissionais.

O artigo 213 do texto constitucional fixa que os recursos públicos serão destinados às escolas públicas. Eles podem ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; e assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao poder público, no caso de encerramento de suas atividades.

O parágrafo 4º do artigo 7º da Lei nº 14.113/20 dispõe que a União complementará os recursos do Fundeb.

O artigo 25 dessa lei federal estabelece que os recursos dos fundos, inclusive aqueles oriundos de complementação da União, serão utilizados pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios no exercício financeiro em que lhes forem creditados, em ações consideradas de manutenção e de desenvolvimento do ensino para a educação básica pública.

O artigo 26 da Lei nº 14.113/20 expressa que, excluídos os recursos de atendimento e de melhoria da aprendizagem com redução das desigualdades em redes públicas, proporção não inferior a 70% dos recursos anuais totais do Fundeb será destinada ao pagamento, em cada rede de ensino, da remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício.

O artigo 29 dessa lei federal fixa que é vedada a utilização dos recursos dos fundos para financiamento das despesas não consideradas de manutenção e de desenvolvimento da educação básica; pagamento de aposentadorias e de pensões; e garantia ou contrapartida de operações de crédito, internas ou externas, contraídas pelos estados, pelo Distrito Federal ou pelos municípios, que não se destinem ao financiamento de projetos, de ações ou de programas considerados ação de manutenção e de desenvolvimento do ensino para a educação básica.

O inciso I do artigo 70 da Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB) expressa que “considerar-se-ão como de manutenção e desenvolvimento do ensino as despesas realizadas com vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições educacionais de todos os níveis, compreendendo as que se destinam à remuneração e ao aperfeiçoamento do pessoal docente e demais profissionais da educação”.

O inciso VI do artigo 71 da LDB fixa que não constituirão despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino aquelas realizadas com pessoal docente e demais trabalhadores da educação, quando em desvio de função ou em atividade alheia à manutenção e desenvolvimento do ensino.

O Manual de Orientação do Novo Fundeb 2021 expressa que é impedido o pagamento, com recursos do Fundeb, de todas as eventuais despesas que, por lei ou orientação jurisprudencial, não forem classificadas como ações de manutenção e de desenvolvimento da educação básica.

O Acórdão nº 2212/22 – Tribunal Pleno do TCE-PR dispõe que não é possível a utilização dos recursos do Fundeb, por meio da cota de 70% destinada ao pagamento de profissionais da educação, para pagamento de aportes para amortização de déficit atuarial de Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Isso porque essa prática ofende as disposições do artigo 212-A da Constituição Federal (CF/88) e dos artigos 26 e 29 da Lei nº 14.113/20, que regulamenta o Fundeb.

O STF decidira, no julgamento da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5719/SP, que o cômputo de despesas com encargos previdenciários de servidores inativos ou do déficit de seu RPPS como manutenção e desenvolvimento de ensino importa em violação à destinação mínima de recursos exigida pelo artigo 212 da CF/88.

No julgamento da ADI nº 5.719/SP, o STF entendeu que a conjugação das regras dos artigos 70, I, e 71, VI, da LDB impõe que somente os gastos com servidores da educação em atividade podem ser contabilizados para fins do artigo 212 da CF/88.

O STF também já manifestou o entendimento de que o cômputo de despesas com encargos previdenciários de servidores inativos ou do déficit de seu regime próprio de previdência como manutenção e desenvolvimento de ensino importa em violação à destinação mínima de recursos exigida pelo artigo 212 da CF/88.

Decisão
O relator do processo, conselheiro Augustinho Zucchi, lembrou que a educação constitui um mecanismo de inclusão, de formação e de transformação social; e, portanto, “é um importante, efetivo e indispensável instrumento de política pública a ser empregado para a transfiguração de nossa sociedade que hoje está repleta de desigualdades”.

Zucchi explicou que, pensando nisso, o constituinte impôs, no artigo 212 da CF/88, que União aplicasse, anualmente, nunca menos de 18%, e os estados, o Distrito Federal e os municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino. Ele afirmou que a Lei Federal nº 11.494/07 foi editada para regulamentar as novas diretrizes aplicáveis ao Fundeb.

O conselheiro ressaltou que Fundeb é o principal instrumento de financiamento da educação básica no Brasil, responsável por mais de 60% da totalidade dos recursos que os estados e os municípios dispõem para investir na área.

No entanto, o relator destacou que a legislação que regulamenta o Fundeb restringe, como regra, o uso dos seus recursos para a remuneração dos profissionais do magistério em educação básica em efetivo exercício, o que impede o custeio de despesas de inativos com orçamento vinculado a esse fundo.

Zucchi salientou que a Emenda Constitucional nº 108/20 acrescentou ao texto constitucional o parágrafo 7º do artigo 212, que veda expressamente o emprego dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento do ensino para o pagamento de aposentadoria e de pensões.

O conselheiro considerou ser impertinente e incabível o emprego de qualquer interpretação extensiva que busque viabilizar o uso dos recursos previstos nos artigos 212 e 212-A do texto constitucional para o pagamento de servidores aposentados. Assim, ele concluiu que não há previsão legal ou espaço hermenêutico que autorize, como regra, o uso dos recursos vinculados pelos artigos 212 e 212-A da Constituição Federal para o pagamento de despesas de servidores inativos da educação, sejam elas de caráter indenizatório ou não.

Os conselheiros aprovaram o voto do relator por unanimidade, na sessão de plenário virtual nº 3/23 do Tribunal Pleno do TCE-PR, encerrada em 2 de março. O Acórdão nº 296/23 – Tribunal Pleno foi disponibilizado em 10 de março, na edição nº 2.937 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC).

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