Padre David Francisquini*
Encontramo-nos no tempo pascal, tempo rico em lições. Há vários pontos de sumo interesse nos relatos evangélicos a serem considerados. A misteriosa aparição a Santa Maria Madalena, a corrida de Pedro e João até o sepulcro, e outros detalhes relevantes. Hoje, porém, iremos nos ater no campo da fé, a Pedro e ao encontro com os discípulos de Emaús.
O nosso Divino Mestre ressuscitou dentre os mortos para prosseguir sua missão de jogar a semente da fé nos corações, confirmando a todos nesta mesma fé e mais, no seu espírito. Para isto multiplicou suas visitas, aparecendo várias vezes aos apóstolos e a seus demais discípulos.
Por isso manifestou-se primeiramente ao mais digno e fiel de todos eles, que era Simão Pedro. Visava consolidar uma fidelidade a toda a prova, para que não ficasse indeciso ou confuso, de modo a não tomar posição inadequada com a súbita e inesperada aparição de Cristo.
Foi Pedro que havia reconhecido e confessado a sua divindade, então veio a ele para consolá-lo, confortá-lo, evitando que caísse em desespero ou desilusão. Aliás, não foi sem razão que alguns dos apóstolos não creram no relato dos dois discípulos de Emaús, como narra Marcos; no entanto, por sua vez São Lucas diz o contrário, afirmando que ‘alguns’ dos discípulos não creram nesse relato daqueles dois discípulos.
São Pedro fora testemunha de muitos milagres. Assim, não se deve imaginar que participasse da falta da fé na ressurreição de Cristo; então Cristo apareceu a ele antes dos demais discípulos.
Nesse episódio tão cheio de significado, desejo ressaltar que os discípulos de Emaús estavam com seus olhos cerrados, obscurecidos, e não puderam, como também ocorreu com Madalena, reconhecer de pronto a Jesus ao encontrá-Lo.
Mas o Salvador prepara a mente deles, ao dar a entender que iria para mais longe naquele caminho. Com isso, dava-lhes ocasião para que aprendessem a se exercitar na virtude da caridade, e assim pudessem saber quem Ele era, justamente no momento da fração do pão.
Aqueles homens, que tinham talvez pouca fé no Salvador, enveredaram pelos caminhos da solicitude e da caridade, quando o transeunte ao cair da noite se dispôs ir mais longe. Ele conquistou os corações daqueles discípulos ao dar-lhes oportunidade de exercitar a virtude da caridade; só assim passaram a compreender que Jesus estava vivo e presente, ao recebê-lo generosamente em sua casa.
Cristo encontra acolhida entre os seus discípulos e no repartir o pão é reconhecido ao estar à mesa. Ao caminhar com eles, seus olhos estavam cerrados, algo os impedia de reconhecer o que viam, como se uma névoa ou cerração os impedisse de ver claramente. Havia em suas almas como que um obstáculo para reconhecer quem era Jesus, aquele que fora glorificado com a Ressurreição.
Foi reconhecido por seus discípulos, ao hospedar o mestre, por um gesto inequívoco que tinham gravado na memória: quando o Salvador procedeu ao partir do pão, como recentemente havia feito em sua presença, na Santa Ceia. Assim devemos nos dispor, interiormente, também nós, ao receber Jesus na Sagrada Comunhão.
Santo Agostinho afirma que o homem instruído nas coisas da fé, quando partilha seus bens maiores com aquele que recebe instrução, pode estar certo de ter Jesus consigo. Diz ainda, o grande doutor, “com efeito os discípulos de Emaús receberam o ensinamento da palavra quando lhes explicava a Sagrada Escritura.
E porque praticavam a hospitalidade, mereceram conhecer na fração do pão, o que não haviam reconhecido quando lhes explicava as escrituras: de fato, não são justos diante de Deus os que ouvem a lei, mas os que observam a lei, aqueles que serão justificados”.
Possamos também nós, neste momento de tantas trevas no ambiente espiritual, em meio à imensa crise moral e religiosa de nossos dias, permanecer ancorados na firme convicção de fé em Jesus ressuscitado.
Assim lograremos receber a imensa graça da fidelidade, apesar de nossas fraquezas e limitações, de modo a merecermos, como prometeu o Senhor na carta à igreja de Filadélfia: porque foste fraca, mas fiel, eis que ponho diante de ti uma porta que abre e ninguém fecha, que fecha e ninguém abre.
Essa a imensa recompensa que devemos pedir à Santíssima Virgem, Medianeira Universal de todas as graças, neste tempo pascal.
*Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria – Cardoso Moreira-RJ