Zeca Dirceu
É a hora de acelerar o processo de união e reconstrução do Brasil. Após posse histórica do presidente Lula no primeiro dia do ano, a forte repulsa da sociedade civil e a firme resposta institucional aos terríveis atos terroristas e golpistas do dia 8 de janeiro e, finalmente, o início dos trabalhos do Judiciário e do Legislativo, em plena normalidade, o desafio agora é criar condições para a implementação dos projetos que impulsionarão o desenvolvimento econômico e social do País.
No âmbito do Parlamento, além da necessária construção da governabilidade, o PT e os partidos da base aliada terão o desafio de aprovar pautas prioritárias, destinadas a consolidar propostas feitas por Lula na campanha eleitoral, com foco no combate à fome, ao desemprego, à destruição ambiental e no resgate e fortalecimento da economia e dos serviços públicos, como nas áreas de saúde e educação.
Como sinal da volta à normalidade na relação entre os Três Poderes, depois de quatro anos de achincalhamento conduzido pelo governo militarista de Bolsonaro, Lula mandou mensagem ao Congresso Nacional em que aponta mudança na relação do Poder Executivo com as instituições e com a sociedade brasileira: harmonia e independência, por meio do diálogo, da boa política e da busca pelos consensos. A mensagem indica, de maneira inequívoca, as prioridades e os desafios a serem enfrentados.
O Brasil e o povo brasileiro foram submetidos, no último governo, a um assombroso processo de fragilização das instituições e de negação de direitos e oportunidades. No campo econômico, a política ultraliberal erodiu as condições de vida da população, trazendo instabilidade, desalento, empobrecimento das classes médias e dos menos favorecidos e retrocessos na produção e no consumo.
Neste cenário, uma das tarefas primordiais da base de apoio do governo no Congresso será a reforma tributária, que, para estar à altura de nossos desafios, precisa ter caráter solidário, justo e sustentável. É impensável manter o sistema atual, que taxa pobres e classe média e mantém os bilionários praticamente sem taxação. O debate em torno dessa reforma decisiva precisa considerar, entre outros pontos, a simplificação e a redução da tributação do consumo, além da progressividade e a restauração do equilíbrio federativo. Um sistema tributário moderno fará aumentar a capacidade do governo de fiscalizar e cobrar de fato impostos dos fraudadores e sonegadores, permitindo mais recursos para investir nas políticas públicas.
O governo deve enviar ao Congresso, nos próximos meses, propostas de criação de um novo arcabouço fiscal para substituir o malfadado Teto de Gastos, que tantos prejuízos trouxe ao país. Esse tema deve ser intensamente debatido com as instituições e a sociedade brasileira, para garantir a construção de regras exigentes e, ao mesmo tempo, confiáveis do ponto de vista da consecução de suas metas. Um marco para garantir previsibilidade e credibilidade nas contas nacionais e, como disse Lula, assegurar políticas públicas mais robustas, para atrair investimentos privados nacionais e externos. Após seis anos de arrocho no orçamento em áreas fundamentais e da destruição do sistema de proteção social, a grande prioridade é restabelecer o funcionamento do Estado.
No campo social, 2023 é o ano do ressurgimento do Bolsa Família, agora renovado e ampliado, para garantir renda compatível com as atuais necessidades da população mais vulnerável do País. Outro ponto importante da agenda é a retomada do diálogo com os movimentos sociais, populares e sindicais, além do estreitamento das relações com o empresariado de distintos segmentos. O estabelecimento de foros entre capital e trabalho significa a retomada de um processo coletivo e participativo de construção de políticas públicas, por meio da restauração de todas as instâncias de participação social. A economia se reerguerá a partir de políticas públicas e estímulos à atuação do empresariado, sempre com respeito aos direitos da classe trabalhadora.
Há também o desafio de recuperar nossa política externa, orientada à reconstrução da cooperação internacional Sul-Sul, com América Latina e África, além da normalização das relações com outros países estratégicos. A agenda inclui o fortalecimento e resgate de iniciativas como o Mercosul, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e os BRICs. Como o próprio Lula disse, trata-se da construção de uma nova ordem global, comprometida com o multilateralismo, respeito à soberania das nações, inclusão social, democracia e sustentabilidade ambiental.
Internamente, é preciso ressaltar a importância da pacificação do País. É o momento de união, para termos foco no combate a problemas como a fome, o garimpo ilegal e a destruição do meio ambiente. Mas nada impede que, dentro da lei e de forma racional, sejam identificados e punidos os responsáveis pelos atos criminosos de 8 de janeiro. O desafio coletivo é retomar as relações civilizadas e respeitosas com quem é e pensa diferente de quem ganhou as eleições, como sempre foi na história do País.
É fundamental combater as ainda existentes redes de difusão de ódio, fake news e mentiras pela internet. Por isso é louvável a iniciativa da Advocacia-Geral da União (AGU) de criar uma unidade exatamente para combater a desinformação que, cotidianamente, tem causado graves prejuízos à sociedade. A Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia da AGU é um avanço institucional nesta nova fase da vida brasileira.
O principal é recolocar o Brasil na trilha do crescimento com reindustrialização, em modelo baseado na transição digital e no desenvolvimento sustentável com respeito à natureza. Mais qualidade de vida, democracia plena, tolerância e fim da escalada do ódio promovido por Bolsonaro. Mais investimentos em educação de qualidade, na pesquisa, ciência, tecnologia e inovação.
Vivemos um momento histórico em que é preciso a união de todos para tirar o Brasil do atoleiro econômico e social ao qual foi levado depois do golpe de 2016, mas sobretudo com o último governo. É hora de enfrentar de uma vez por todas as inaceitáveis desigualdades no país, construindo um desenvolvimento que seja verdadeiramente justo, soberano, democrático e sustentável. Esta é a nossa tarefa histórica. O Brasil precisa voltar a ser feliz de novo.
Zeca Dirceu (PR) é líder da Bancada do PT na Câmara dos Deputados