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OS PRÓXIMOS LONGOS TRÊS MESES

MARLI GONÇALVES

Pensa que acabou? Seja o que for, o que resultar, teremos ainda longos três meses pela frente para acabar de roer as unhas até o toco, acalmar o coração, parar de ouvir tantas aleivosias, mentiras e preconceitos, poder sentir o que é que exatamente vem por aí

89 dias. 2136 horas. 128.160 segundos. Uma eternidade. Viveremos ainda mais algumas guerrinhas de nervos daquelas pro bem e pro mal. Até as posses, chuááá, muita água ainda vai rolar e é difícil prever se ela, a principal, do presidente da República, será serena, limpa, transparente, se escoará naturalmente pelo rio da democracia, ou se alguma pororoca poderá vir nos assustar, com monstros soltos e atiçados.

Faz tempo, muito tempo, que não respiramos aliviados. E aí que está. Vamos ter de aguardar mais. Há tanta coisa para se arrumar no país escangalhado, dividido, raivoso, que só após muito tempo com alguma acomodação das forças – que costumam mesmo ser díspares – proclamadas vitoriosas em todo o país, poderemos ter uma leve noção do que exatamente emergiu das urnas.

Considerando que o debate para a eleição presidencial tomou para si boa parte da atenção geral, o resultado da ocupação dos legislativos poderá ser temerário. Com a eleição do mesmo dos mesmos bem ruinzinhos, chegada dos até então ainda mais desconhecidos e que vieram no pó da estrada grudados você bem sabem onde dos majoritários. Podem chegar de paraquedas, surpresos eles próprios, pelos quocientes eleitorais dos partidos e seus números jogados como loteria, patinhos na lagoa, cabalísticos, mágicos, ou chutados qualquer coisa. No Congresso Nacional e nas casas legislativas dos Estados fica a panela onde se cozinham os acordos, as leis, as verbas, as ideias, os ingredientes, as ameaças e liberações. O freio ou o acelerador das mudanças. Oxalá esse resultado seja ao menos melhor do que o que está aí, embora a gente saiba que, infelizmente, sempre pode mesmo piorar, e que o descuido e desconhecimento dos eleitores sobre essas pessoas faz parte de nossa estranha formação política.

Haverá uma reacomodação de terreno – isso será certo. Pedidos de desculpas entre quem se atacou dentro de um mesmo arco ideológico, para agora buscar um cantinho, uma lasquinha do vitorioso, alguma nomeação. Muitas viradas de costas, bananas e traições para os derrotados – algumas que vimos até logo durante o processo eleitoral. Os barcos vão sendo abandonados nas margens, à cada pesquisa divulgada. Uns vão fingir que não viram, não disseram, não pensaram, não conspiraram; os outros vão fingir que acreditam. No caso, não é varinha de condão, mas a caneta, e que esperamos que seja mais sofisticada em suas assinaturas pelo menos um pouco mais do que a tal Bic que suportamos nos últimos quatro anos.

De acordo com o resultado que sair das urnas, saberemos se haverá, se demorará, o resgate da bandeira nacional e suas cores, a coitada, sequestrada. Se a vitória for de um lado mais avermelhado, saber se os outros tons, mais róseos, digamos assim, serão por eles respeitados, já que certamente tomaram forte posição e importância nos últimos dias em prol de um resultado que afastasse o perigo de ruptura e de uma grave e dolorosa crise institucional.

Teremos de ter muita paciência e perseverança nas próximas semanas. Quando saberemos o quanto nos livraremos do circo cercadinho, das ridículas lives de toda uma turma desprezível, dos robôs da familícia, do desprezo pela Ciência, da misoginia, do racismo e desrespeito à liberdade religiosa e de gênero; que sejam desmascarados os pastores pecadores, os agro e tóxicos, os ministros que ninguém sabe o nome e suas boiadas e fogo passando destruindo nossas matas. Dos metidos a besta em paragens onde não tinham posto os pés. Das ameaças de armas, CACs (caçadores de quê?) e de valentões de cara feia. Se recuperaremos alguma boa imagem junto à já atordoada comunidade internacional, de quem precisaremos ter apoio para nos levantarmos.

Especialmente, apenas nos próximos tempos poderemos sentir se a oposição, centro e esquerda, enfim amadureceram. Se saberão rever seus graves erros com pelo menos alguma humildade, aceitando que enfim e ao cabo foram esses erros que nos levaram ao atual desgoverno de direção.

Se todos poderão se sentar à mesa para o mais rápido possível compartilhar seus pratos e intenções para servir aos mais necessitados. Com respeito, educação e saúde.


MARLI GONÇALVES – Jornalista, consultora de comunicação, editora do Chumbo Gordo, autora de Feminismo no Cotidiano – Bom para mulheres. E para homens também, pela Editora Contexto. (Na Editora e na Amazon). marligo@uol.com.br / marli@brickmann.com.br

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